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quinta-feira, fevereiro 08, 2007

A VAIDADE, O BELO E A SABEDORIA

Tenha paciência - o texto é longo

Por esses dias, lendo um comentário de um amigo a respeito de seu próprio blog (
http://amigodemontaigne.blogspot.com) , fiquei pensando sobre a palavra vaidade. Senso comum tem-se a vaidade como algo negativo, repugnante e que de alguma maneira deve ser evitado.
Recorri ao dicionário Houaiss e encontrei a seguinte definição, entre outras: “valorização que se atribui à própria aparência, ou quaisquer outras qualidades físicas ou intelectuais, fundamentada no desejo de que tais qualidades sejam reconhecidas e admiradas pelos outros” ou, ainda, “qualidade do que é vão, vazio, firmado sobre aparência ilusória”.
Veja que a vaidade é assunto tão sério, que até a Santa Igreja Católica a colocou entre os sete pecados capitais, equiparando-a ao orgulho e a arrogância e ainda, associando-a à soberba. Segundo esta religião a pessoa vaidosa prima por se vangloriar de suas atitudes e vai para o inferno.
A psicologia arrumou um mecanismo e incluiu a vaidade entre seus estudos, representada maximamente por Freud, através do mito de Narciso. E como dizia Caetano - "Narciso acha feio o que não é espelho".
Entendo que há um exercício a ser feito aqui. Os orientais já nos ensinaram a ver o mundo pela ótica da dualidade e as polaridades trazem o devido equilíbrio para qualquer relação. Quente e frio, doce e amargo, alto e baixo, feio e belo, etc, são algumas das possibilidades que encontramos na avaliação das polaridades, sejam elas negativas ou positivas.
Seguindo este raciocínio questiono: é possível ver o lado belo da vaidade?
Pensemos um pouco mais. Os gregos antigos, no apogeu de sua civilização, estabeleceram os parâmetros existenciais para toda a civilização ocidental, em todos os seguimentos culturais. A filosofia permeou e permeia toda o conhecimento humano ocidental até os dias de hoje. Estes nobres helenistas fortaleceram a ciência, a cultura, a religião e também, a arte. Exultaram o belo e premiaram o mundo com suas mais fascinantes e vistosas criações. A arte grega, como um fim em si, deixou-nos poesias, contos, romances, música, construções e fabulosas esculturas. Não tenho medo de errar, a apreciação e a exposição do belo, através da vaidade de uns, causou a sublimação de muitos.
Penso que a vaidade, assim como tudo na vida, não é o mal em si. O mal, talvez, seja o uso que se faz dela, através do excesso. O filósofo Matias Aires (1705-1764), dizia o seguinte (transcrição literal): “A vaidade por ser causa de alguns males, não deixa de ser princípio de alguns bens: das virtudes meramente humanas, poucas se haviam de achar nos homens, se nos homens não houvesse vaidade: não só seriam raras as acções de valor, de generosidade, e de constância, mas ainda estes termos, ou palavras, seriam como bárbaras, e ignoradas totalmente. Digamos, que a vaidade as inventou”. Muito apropriado este pensamento de Matias Aires pois, sob o título da vaidade algumas pessoas fazem o bem e incitam outras tantas a também fazê-lo.
Entramos aqui no exercício da sabedoria, tão difícil de se obter e quando lá se chega, despreza-se o feito, mas seguramente deixa-se a lição. Michel de Montaigne, em seus “Ensaios - Da Exercitação”, tece um comentário a respeito de Sócrates que muito agrega nesta nossa reflexão. Ele diz o seguinte: “Porque Sócrates foi o único a compreender acertadamente o preceito do seu Deus, o de conhecer-se a si mesmo, e através de tal estudo, ter chegado a desprezar-se, só ele foi julgado digno de sobrenome de «sábio». Quem assim se conhecer, que tenha a audácia de, pela sua própria boca, o dar a conhecer.” Brilhante Montaigne, Amigo do meu Amigo.
Não se perde o belo pela vaidade, mas pelo desejo de desejar cada vez mais e indiscriminadamente. Que se louve e se honre o belo.
Eu vejo a vaidade, em sua vertente positiva, como uma impulsora à criatividade e até, para a prosperidade.

Grande abraço

Um comentário:

  1. Paulo, texto lido e registrado. Bom argumento, mas ainda estou pensando. Abraço e obrigado pelo estímulo.

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